Boato – O líder do PCC Marcos Camacho deu uma entrevista assustadora ao jornal O Globo em que diz que o problema do Brasil é estrutural.
Desde o meio das eleições do ano passado, o nome do líder do PCC Marcos Herbas Camacho, mais conhecido como Marcola, tem circulado na internet uma mensagem sobre uma suposta entrevista que ele teria dado para o jornal O Globo.
Na entrevista, Marcola teria falado que o problema do Brasil é estrutural, reclamando do governo, das favelas, que não tem medo de morrer, que é inteligente, que o tráfico é uma empresa moderna e que Estado brasileiro está quebrado. Leia o texto que circula online:
Assustadora mas imperdível a entrevista com o líder do PCC, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola , ao jornal O Globo, Estamos todos no inferno. Não há solução, pois não conhecemos nem o problema.
O GLOBO: Você é do PCC? – Mais que isso, eu sou um sinal de novos tempos. Eu era pobre e invisível… vocês nunca me olharam durante décadas… E antigamente era mole resolver o problema da miséria… O diagnóstico era óbvio: migração rural, desnível de renda, poucas favelas, ralas periferias… A solução é que nunca vinha… Que fizeram? Nada. O governo federal alguma vez alocou uma verba para nós? Nós só aparecíamos nos desabamentos no morro ou nas músicas românticas sobre a “beleza dos morros ao amanhecer”, essas coisas… Agora, estamos ricos com a multinacional do pó. E vocês estão morrendo de medo… Nós somos o início tardio de vossa consciência social… Viu? Sou culto… Leio Dante na prisão…
O GLOBO: – Mas… a solução seria… – Solução? – Não há mais solução, cara… A própria idéia de “solução” já é um erro. Já olhou o tamanho das 560 favelas do Rio? Já andou de helicóptero por cima da periferia de São Paulo? Solução como? Só viria com muitos bilhões de dólares gastos organizadamente, com um governante de alto nível, uma imensa vontade política, crescimento econômico, revolução na educação, urbanização geral; e tudo teria de ser sob a batuta quase que de uma “tirania esclarecida”, que pulasse por cima da paralisia burocrática secular, que passasse por cima do Legislativo cúmplice (Ou você acha que os 287 sanguessugas vão agir? Se bobear, vão roubar até o PCC…) e do Judiciário, que impede punições. Teria de haver uma reforma radical do processo penal do país, teria de haver comunicação e inteligência entre polícias municipais, estaduais e federais (nós fazemos até conference calls entre presídios…). E tudo isso custaria bilhões de dólares e implicaria numa mudança psicossocial profunda na estrutura política do país. Ou seja: é impossível. Não há solução.
O GLOBO: – Você não têm medo de morrer? – Vocês é que têm medo de morrer, eu não. Aliás, aqui na cadeia vocês não podem entrar e me matar… mas eu posso mandar matar vocês lá fora…. Nós somos homens-bomba. Na favela tem cem mil homens-bomba… Estamos no centro do Insolúvel, mesmo… Vocês no bem e eu no mal e, no meio, a fronteira da morte, a única fronteira. Já somos uma outra espécie, já somos outros bichos, diferentes de vocês. A morte para vocês é um drama cristão numa cama, no ataque do coração… A morte para nós é o presunto diário, desovado numa vala… Vocês intelectuais não falavam em luta de classes, em “seja marginal, seja herói”? Pois é: chegamos, somos nós! Ha, ha… Vocês nunca esperavam esses guerreiros do pó, né? Eu sou inteligente. Eu leio, li 3.000 livros e leio Dante… mas meus soldados todos são estranhas anomalias do desenvolvimento torto desse país. Não há mais proletários, ou infelizes ou explorados. Há uma terceira coisa crescendo aí fora, cultivado na lama, se educando no absoluto analfabetismo, se diplomando nas cadeias, como um monstro Alien escondido nas brechas da cidade. Já surgiu uma nova linguagem.Vocês não ouvem as gravações feitas “com autorização da Justiça”? Pois é. É outra língua. Estamos diante de uma espécie de pós-miséria. Isso. A pós-miséria gera uma nova cultura assassina, ajudada pela tecnologia, satélites, celulares, internet, armas modernas. É a merda com chips, com megabytes. Meus comandados são uma mutação da espécie social, são fungos de um grande erro sujo.
O GLOBO: – O que mudou nas periferias? – Grana. A gente hoje tem. Você acha que quem tem US$40 milhões como o Beira-Mar não manda? Com 40 milhões a prisão é um hotel, um escritório… Qual a polícia que vai queimar essa mina de ouro, tá ligado? Nós somos uma empresa moderna, rica. Se funcionário vacila, é despedido e jogado no “microondas”… ha, ha… Vocês são o Estado quebrado, dominado por incompetentes. Nós temos métodos ágeis de gestão. Vocês são lentos e burocráticos. Nós lutamos em terreno próprio. Vocês, em terra estranha. Nós não tememos a morte. Vocês morrem de medo. Nós somos bem armados. Vocês vão de três-oitão. Nós estamos no ataque. Vocês, na defesa. Vocês têm mania de humanismo. Nós somos cruéis, sem piedade. Vocês nos transformam em superstars do crime. Nós fazemos vocês de palhaços. Nós somos ajudados pela população das favelas, por medo ou por amor. Vocês são odiados. Vocês são regionais, provincianos. Nossas armas e produto vêm de fora, somos globais. Nós não esquecemos de vocês, são nossos fregueses. Vocês nos esquecem assim que passa o surto de violência.
O GLOBO: – Mas o que devemos fazer? – Vou dar um toque, mesmo contra mim. Peguem os barões do pó! Tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas. Mas quem vai fazer isso? O Exército? Com que grana? Não tem dinheiro nem para o rancho dos recrutas… O país está quebrado, sustentando um Estado morto a juros de 20% ao ano é tão incrivelmente objetiva e absurda que nem parece possível que seja uma realidade, mas infelizmente é assim que está funcionando o nosso País
Marcola do PCC dá entrevista assustadora ao jornal O Globo?
A suposta entrevista voltou com todas as forças no debate público agora em 2023. Porém, a história que aponta para a tal entrevista de Marcola para o jornal O Globo é falsa e já foi desmentida pelo Boatos.org lá em 2014. Como o desmentido da época vale para hoje, relembre o que escrevemos:
O texto realmente foi publicado pelo Jornal O Globo? Sim. A entrevista é verdadeira? Não. Se você está se perguntando “como assim”? Calma, nós explicaremos. Embora este texto esteja circulando atualmente pelos murais e páginas do Facebook, essa notícia já circulava na internet em 2006, data em que a entrevista foi divulgada.
Em 23 de maio de 2006, o Jornal O Globo publicou a notícia em sua edição impressa. Porém, o texto é uma ficção produzida por Arnaldo Jabor. O jornalista confessa sobre o texto em uma declaração para a CBN. O texto foi uma crítica, que realmente surtiu efeito na mídia, pois atacou diretamente a corrupção, citando que “tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas”.
Inclusive nos comentários (ao total 280) no texto, nota-se que algumas pessoas já sabiam que tratava-se de algo inventado, porém, acreditam que as declarações se aproximam do que realmente acontece no Brasil. Um comentário diz “O importante é que mostra a realidade completa com clareza”. O Observatório da Imprensa publicou uma reflexão interessante sobre a falsa notícia e o tema.
Como vocês podem ver, a entrevista de Marcola nunca aconteceu e o texto foi total invenção de Arnaldo Jabor. Entretanto, muitos sites e páginas do Facebook acabaram descontextualizando a notícia, e replicando o conteúdo, gerando o efeito clássico de corrente.
Resumindo: é falsa a informação que aponta que Marcola do PCC teria dado a entrevista em questão ao jornal O Globo. Na realidade, trata-se de uma entrevista fictícia que foi fruto de uma coluna de Arnaldo Jabor em 2006 no veículo de mídia em questão.
Ps.: Esse artigo é uma sugestão de leitores do Boatos.org. Se você quiser sugerir um tema ao Boatos.org, entre em contato com a gente pelo site, Facebook e WhatsApp no telefone (61) 9275-5610
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