Boato – A França aprovou a liberação do aborto até os nove meses de gravidez. Por 60 votos a 37, a Assembleia Nacional francesa autorizou esta mudança na lei de bioética do país.
Quando a vida começa? Quando ocorre uma fecundação? Ou quando se iniciam as atividades cerebrais e o coração está batendo? Ou, ainda, após o bebê dar os primeiros gritos na sala de parto? Ou será que a vida só começa mesmo quando a criança completa dois anos de idade e começa a se reconhecer como indivíduo?
Essa é uma das muitas questões que fazem do aborto voluntário um tema bastante polêmico, que gera debates calorosos aqui no Brasil e em outros lugares do mundo, envolvendo conceitos morais, religiosos e legais. E, como era de se esperar, não faltam boatos na internet para acirrar as discussões, inclusive, com fatos fora do contexto.
Recentemente, por exemplo, começou a circular nas redes sociais uma publicação que dá conta de que a França teria aprovado a liberação do aborto até os nove meses de gravidez. De acordo com a postagem, a Assembleia Nacional do país teria se reunido na calada da noite e, por 60 votos a 37, autorizado a medida, junto com uma série de outras mudanças na lei de bioética francesa. Confira, a seguir, o texto original da publicação que está rodando online:
Confira o desmentido em vídeo:
FRANÇA APROVA O ABORTO EM QUALQUER PERÍODO DA GRAVIDEZ Na calada da noite, a Assembleia Nacional Francesa aprovou um série de mudanças na lei de bioética do país, uma das quais legaliza o aborto voluntário até aos nove meses de gestação. Por 60 votos a 37, os representes do povo aprovaram na prática, o assassinato de bebês. Faltam-me palavras diante deste descalabro! Assassinos! Criminosos são estes que aprovam o aborto. O pior de tudo é que existem “cristãos” que advogam essa prática hedionda. Com lágrimas nos olhos, Renato Vargens
França aprovou a liberação do aborto até os nove meses de gravidez?
É óbvio que a publicação, com uma suposta decisão sobre um assunto tão polêmico quanto este, mesmo que em outro país, viralizou rapidamente entre os internautas brasileiros. Mas será mesmo que a França aprovou a liberação do aborto até os noves meses de gravidez? A resposta é não! E o porquê você confere a seguir.
Para começar, não é de hoje que vemos surgirem na internet fake news com interpretações equivocadas em relação a projetos ou leis aprovadas sobre temas ainda considerados “tabus”. Inclusive, aqui no Boatos.org, nós já desmentimos várias delas, como o boato que dizia que o partido PCdoB teria sugerido projeto que legaliza casamento entre pais e filhos (incesto) e poliamor; outro bem parecido, que denunciava que o namorado de Fátima Bernardes teria enviado projeto sobre o mesmo assunto; e, por último, ainda “batendo nessa tecla”, uma história falsa de que Manuela D’Ávilla também teria criado a lei do poliamor para liberar casamento entre pais e filhos.
E, assim como nos casos citados, no nosso desmentido de hoje, o que há é uma distorção de uma lei aprovada na França sobre o aborto. O fato é que a Assembleia Nacional francesa fez uma modificação em uma regulamentação que já existia há algum tempo sobre o assunto.
A regra era a seguinte: abortos realizados até 12 semanas de gestação já eram considerados legais no país. Porém, caso o bebê tenha alguma condição de saúde considerada incurável, a interrupção médica da gravidez poderia ser feita em qualquer momento até o fim da gestação, após pedido médico.
Inclusive, na França, a história foi explicada pela AFP e pela LCI. Começando pelo fato de que interrupção voluntária da gravidez (aborto) e interrupção médica da gravidez (IMG) são duas coisas distintas, como você vai entender melhor a seguir.
A IMG, como o próprio nome já diz, só deve acontecer por razões médicas, quando existe uma grande probabilidade de o feto apresentar uma condição particularmente grave e incurável ou se a gravidez colocar em risco a saúde da mulher. Já o aborto, por lei, continua sendo possível somente até 12 semanas de gestação.
Ou seja, a emenda votada na noite de 31 de julho para 1º de agosto de 2020, que incluiu o “sofrimento psicossocial” como motivo de “grave perigo” que poderia justificar a interrupção da gravidez, diz respeito à IMG, e não ao aborto, ao contrário do que sugere o boato.
A alteração na lei é apoiada por deputados socialistas e, também, médicos especialistas, uma vez que a prática da interrupção médica da gravidez (IMG) é muito mais rara e tem cerca de 7000 procedimentos por ano (200 a 300 por sofrimento psicossocial), contra 215.000 a 230.000 abortos anuais (interrupções voluntárias da gravidez).
Além disso, como falou Marie-Noëlle Battistel, deputada e vice-presidente da delegação para os direitos da mulher e co-relatora da missão de informação sobre o aborto, ao site LCI, o objetivo da emenda no texto é, ao mesmo tempo, esclarecer e fazer com que as causas psicossociais sejam consideradas pela faculdade de medicina durante o exame de um pedido de interrupção médica da gravidez.
Por último, vale ressaltar que, ao contrário do que apontam alguns títulos, essa emenda à lei de bioética francesa (Emenda 524) ainda não foi completamente aprovada. Ela ainda precisa passar pelo Senado, para depois ser estudada e lida novamente na Assembleia Nacional da França antes de ser implementada.
Resumindo: A publicação que dá conta de que a França aprovou a liberação do aborto até os nove meses de gravidez não é verdadeira. O aborto (interrupção voluntária da gravidez) continua sendo permitido naquele país somente até 12 semanas de gestação. Já a interrupção médica da gravidez (IMG) pode ser feita até o fim da gravidez, mas somente, como o nome já diz, mediante pedido médico, inclusive, por motivos psicossociais.
Ps.: Esse artigo é uma sugestão de leitores do Boatos.org. Se você quiser sugerir um tema ao Boatos.org, entre em contato com a gente pelo site, Facebook e WhatsApp no telefone (61)99177-9164.
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