Boato – Em Alcaçuz (RN), presídio não registrou nenhuma morte por Covid-19, porque diretor-clínico obrigou o uso de ivermectina.
Ao que tudo indica, o delírio coletivo de que a ivermectina pode tratar ou curar a Covid-19 voltou com força à internet. Nas últimas semanas, diversas histórias bizarras (para não dizer outra coisa) sobre o assunto foram amplamente compartilhadas nas redes sociais.
Hoje, o assunto volta a aparecer no Boatos.org. De acordo com uma história que está sendo compartilhada por aí, o presídio de Alcaçuz (RN), que abriga quase 1700 detentos, não teria registrado nenhuma morte por Covid-19 desde o início da pandemia por causa de uma “remédio milagroso”: a ivermectina. A história ainda aponta que dos 224 infectados, nenhum evoluiu para casos graves. Confira:
Versão 1: “ZERO ÓBITOS POR COVID…………COM TRAT. IMEDIATO…………Dir. Cli DA SAÚDE DO PRESÍDIO DE ALCAÇUZ FALA SOBRE O SUCESSO DO PROTOCOLO COM USO DE IVERMECTINA AUTORIZADO.( Trat. Precoce). 1.700 detentos e zero óbito. Se fosse usado no Brasil ,poucas mortes”. Versão 2: “INCRÍVEL: Uso de ivermectina faz com que presídio não tenha casos graves e nem mortes por Covid-19, diz médico. O diretor-clínico do presídio de Alcaçuz detalhou como tem tratado os detentos do maior presídio do RN”.
Versão 3: “INCRÍVEL: Uso de ivermectina faz com que presídio não tenha casos graves e nem mortes por Covid-19, diz médico; O diretor-clínico do presídio de Alcaçuz, doutor detalhou como tem tratado os detentos do maior presídio do Rio Grande do Norte. O médico explicou que criou um protocolo usando medicamentos como Azitromicina, Ivermectina e, em alguns casos, corticoide. Desde o início da pandemia, nenhum preso morreu ou evoluiu para um caso grave, segundo relatou. Ele disse ainda que usa Ivermectina nesse presídio há 4 anos para combater escabiose e adaptou o tratamento para a Covid-19. Dos quase 1.700 detentos de Alcaçuz, houve 224 casos confirmados até o momento, mas nenhum caso grave registrado. As informações são do Grande Ponto”.
Presídio de Alcaçuz não teve mortes por Covid-19 por causa de tratamento com ivermectina?
A informação, claro, fez um enorme sucesso nas redes sociais, em especial, no Twitter e foi bastante compartilhada em grupos negacionistas e antivacina. Apesar disso, a história não é bem assim. A explicação fica por conta da origem da entrevista e das medidas adotadas pela Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (Seap).
Para começo de história, basta olhar para a publicação para perceber que ela apresenta as principais características de fake news na internet, como o caráter vago, alarmista, alguns erros de português e a falta de fontes confiáveis.
Além disso, como já mencionado anteriormente, histórias falsas sobre o uso da ivermectina no tratamento da Covid-19 não são novidade por aqui. A equipe do Boatos.org desmentiu dezenas delas, como a que dizia que um estudo da Universidade da Oxford teria constatado que a ivermectina reduz em 56% mortes por Covid-19 e poderia ter salvo 250 mil pessoas no Brasil. Também a que indicava que as vacinas não seriam mais necessárias, porque a ivermectina seria aprovada para terapia contra a Covid-19 e, por fim, a que apontava que a Índia teria derrotado a Covid-19 porque adotou o uso da ivermectina e suspendeu a vacinação em massa.
Ao procurar por mais informações sobre a história de hoje, descobrimos que a tal entrevista usada como fonte, de fato, é real. Entretanto, ela é antiga. A conversa foi realizada em março de 2021, pela rádio 98 FM.
Apesar disso, alguns detalhes apontam que toda essa história é falsa. O primeiro deles é sobre a própria ivermectina. Como já estamos cansados de repetir por aqui, o uso da ivermectina no combate à Covid-19 não possui evidências científicas. Em um dos nossos últimos textos sobre o assunto, lembramos da origem dessa história e dos malefícios da automedicação.
Também não precisamos nos alongar sobre os usos recomendados da ivermectina e seus efeitos colaterais em superdosagens. Até o momento, sabemos que a ivermectina é bastante eficaz para tratar casos de parasitoses, como infestação de piolhos e sarnas. Por outro lado, não existem estudos que comprovem a eficácia da ivermectina contra a Covid-19. O único estudo que apontou algo de positivo nessa questão (e que continua sendo usado, de forma completamente equivocada, para defender o uso da substância) não possui validade no mundo real. Isso porque a pesquisa que apontou alguma eficácia da ivermectina no combate à Covid-19 foi realizada em células de laboratório e em uma dosagem 10 vezes maior do que a dosagem máxima recomendada (e segura para seres humanos). Além disso, tomar medicamentos sem orientação médica é uma prática bastante perigosa. No caso da ivermectina, a intoxicação pelo medicamento pode levar à toxicidade do sistema nervoso central, causar hepatite medicamentosa e agravar quadros de asma (sem falar nos outros efeitos colaterais, como dor de cabeça, náusea, vômito, dores musculares, dores de cabeça, taquicardia e inchaço pelo corpo).
O segundo detalhe é que a fala repercutiu de maneira negativa entre a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (Seap) e outros setores da sociedade. A Rede Potiguar de Apoio à Pessoa Privada de Liberdade Egressa e Familiares do Sistema Penitenciário (Raesp) afirmou, em pedido à Seap, que o diretor-clínico teria realizado experimentação biomédica entre os detentos (experimentos em cobaias) e exigiu um posicionamento da Seap sobre o caso.
Já o o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio Grande do Norte – CEPCT/RN solicitou ao prefeito de Nísia Floresta, Daniel Gurgel, a instauração de um procedimento administrativo para avaliar a conduta do médico. Em resposta, a Seap afirmou que não autorizou o médico a realizar o uso de ivermectina para tratamento precoce de detentos contra a Covid-19. De acordo com o titular da Seap, Pedro Florêncio Filho, o motivo para o sistema prisional do Rio Grande do Norte não ter registrado nenhum óbito por Covid-19 não tem nada a ver com o uso de ivermectina, mas sim de medidas de segurança adotadas.
Em matéria publicada pelo site potiguar Saiba Mais, Florêncio Filho destacou que os presídios adotaram um rígido controle dos presos que adentram ao sistema prisional, o isolamento dos detentos que já estão encarcerados, também criaram um porta de entrada e um local único para quarentena, separando diariamente presos e acompanhando todos aqueles que apresentarem algum sintoma.
E toda essa informação é confirmada pelos dados estaduais de Covid-19 no sistema prisional do Rio Grande do Norte. Ao analisar os dados, é possível ver que os casos de infectados pela doença são baixos em todos os presídios do estado, com ou sem o uso da ivermectina.
Em resumo: a história que diz que o presídio de Alcaçuz (RN) não teve mortes por Covid-19, porque fez tratamento precoce com ivermectina é falsa! A entrevista usada como fonte da história, de fato, ocorreu. Mas é antiga e repercutiu de maneira negativa. Em nota, a Seap afirmou que o baixo número de casos de Covid-19 no sistema prisional do Rio Grande do Norte não se deve ao uso da ivermectina, mas sim das medidas de segurança adotadas em todo o estado. Ou seja, a história não passa de balela.
Ps.: Esse artigo é uma sugestão de leitores do Boatos.org. Se você quiser sugerir um tema ao Boatos.org, entre em contato com a gente pelo site, Facebook e WhatsApp no telefone (61) 99458-8494.
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